Este elemento de vestuário é uma das peças mais ricas do traje minhoto e um adorno indispensável dos fatos regionais. Confeccionado em tear nas mais variadas cores e desenhos está geralmente em harmonia com a cor do fato. Os aventais de puxados são os mais difíceis de executar mas ainda são confeccionados nesta região. Muitos destes aventais tem no cós, boradado a ponto cruz a palavra amor ou as iniciais da possuidora
O Traje à Vianesa é um produto múltiplo, composto por um conjunto de peças, todas manufaturadas artesanalmente na região do Minho (à excepção dos lenços), cujo resultado final se deve à combinação poliédrica entre elas e ao modo como os adornos em ouro o enfeitam e sublinham.
O padrão geral do Traje à Vianesa, tal como era percecionado em 1930, é constituído por: “saia curta (aí pelo tornozelo), às listas verticais, de roda farta, pregueada miudamente na cinta, com barra larga a que chamam “forro”, avental franzido também na parte superior, camisa branca, de mangas compridas, apanhadas nos ombros; colete que não desce da cintura; lenço traçado no peito e apertado atrás na altura da cinta; lenço trespassado sobre a nuca e atado no alto da cabeça; algibeira, que na forma lembra o coração e fica visível entre a saia e o avental; meias brancas, feitas à mão; chinelas.
A produção caseira das peças que compõem o traje foi permitindo a sua adaptação ao tipo de uso pretendido, e a sua evolução foi permeável às influências das modas e dos gostos. Assim, o traje à vianesa nunca foi imutável nem nasceu de acordo com um modelo único que a ele sempre se mantivesse fiel; pelo contrário, ele foi adquirindo sentidos que ultrapassaram e se sobrepuseram ao aspecto utilitário do uso quotidiano, transformando-se, adquirindo e reforçando um valor simbólico e cerimonial relevante.
Desta forma, quando se fala de Traje à Vianesa – Viana do Castelo, fala-se do que mais vulgarmente ainda se chama Traje à Lavradeira ou de Festa, nas variantes assumidas pelas diferentes freguesias de Viana do Castelo.
Nestas freguesias, os respetivos grupos folclóricos e etnográficos, que foram surgindo a partir dos 20 do século XX, podem ser considerados os grandes responsáveis pela maior definição e apropriação das “diferenças” que agora se verificam e que, anteriormente, não seriam tão vincadas ou disputadas.
Nestes grupos assistiu-se a um processo de reivindicação e de apropriação dos sinais distintivos de uma identidade, cada qual e sempre a “mais deles”.
Cada peça é confecionada recorrendo a determinadas matérias-primas como o linho, a lã, fios de bordar de algodão e de lã, vidrilhos e lantejoulas mas também àqueles tecidos de manufatura industrial como algodão, o linho, veludos e flanelas de algodão e de lã.
Um ou vários saberes artesanais são decisivos na manufactura de algumas das peças mais emblemáticas, como acontece no caso das saias e dos aventais (que são tecidos em tear manual), com o bordado (nas camisas, barras das saias, coletes e algibeiras), com a renda (no caso das meias), com o fabrico das chinelas e ainda na confecção/costura de saias e aventais, camisas, coletes e algibeiras.
Não custa a crer que em 1887 cada uma das peças do Traje à Vianesa (com a já referida exceção dos lenços usados na cabeça e ao peito) se devesse, integralmente, a produções locais e domésticas. Nos linhares cultivava-se o linho que as mulheres de cada família tratavam até o transformarem num fio que depois era trabalhado ao tear.
Na altura, as camisas (e a roupa de baixo) eram talhadas em tecido de linho. Progressivamente este linho produzido e tecido artesanalmente foi sendo substituído por linho de manufatura industrial e até por tecido de algodão.
Igualmente, nos finais do século XIX, a lã seria, em grande parte, originária dos pequenos rebanhos de ovelhas que cada família criava com esse fim. Essa lã era depois fiada, tingida e tecida. E se numa primeira fase se utilizavam corantes naturais, logo na passagem do século XIX para o século XX, se passaram a utilizar, banalmente, corantes sintéticos.
Todavia, tal como aconteceu com o linho, o fio de lã deixou de ser obtido e preparado localmente. Manteve-se, no entanto, a produção de tecidos de lã em tear manual, utilizando-se fio de lã produzido industrialmente.
Tradicionalmente, os teares manuais são estreitos, pelo que a largura do conjunto dos fios da “trama” andará, em média pelos 65 centímetros. Esta será a largura do tecido a qual irá corresponder à altura da saia. Mas, ao tempo em que se definiu este traje, as saias necessitariam de ter cerca de 80 centímetros de altura, pelo que se resolveu este problema acrescentando, em baixo, uma barra, na parte da saia que se sujava com maior facilidade e estava mais sujeita a degradar-se e a romper-se.
Este acréscimo, geralmente de flanela de lã, tomou o nome de “forro”. Sublinhe-se que a expressão deste “forro”, pela cor, largura e decoração, constitui um elemento marcante, porventura dos mais diferenciadores na definição dos vários modos de organizar o Traje à Vianesa adiante explicitados - Areosa, Afife, Santa Marta de Portuzelo e Geraz do Lima -, a que acrescem as “derivações” destes de Carreço, Perre, Outeiro, Meadela, Cardielos, Serreleis, São Lourenço da Montaria, Amonde e Freixieiro de Soutelo.
O tear (onde se tecem as saias e os aventais) era urdido com fio de estopa ou de linho mas, desde há mais de 100 anos, que se generalizou a urdidura em fio de algodão. Esta trama de fios claros é tapada, com a lã da teia na qual se formam variadíssimos padrões de riscas. Umas vezes, riscas largas vermelhas, a que muitos chamam “listões”, alternam com riscas pretas e brancas, mais fininhas, mas não é raro encontrarem-se outras cores.
Por vezes algumas destas riscas apresentam um trabalho de “puxados” que definem um desenho. Embora seja quase impossível detetar a totalidade das combinações existentes, pois, provavelmente, não existem duas saias iguais, não se associa nenhum padrão específico a qualquer das freguesias havendo, no entanto, aqueles cuja predominância é maior.
A tecelagem manual constitui um traço distintivo e marcante, a caracterizar a manufatura de saias e aventais. Outra das técnicas artesanais que imprime ao Traje à Vianesa – Viana do Castelo um aspeto único e diferenciador é o bordado. O bordado marca os coletes, os forros das saias, os cozes dos aventais, as camisas, as algibeiras e, nalguns casos, as próprias chinelas.
A ostentação do bordado no traje atual corresponde a uma evolução que se terá iniciado porventura nas primeiras décadas do século XIX, quando o bordado aparecia nos coletes, camisas e nas algibeiras, todavia, de um modo muito mais discreto e contido do que aquele que se verifica nos dias de hoje.
As barras das saias só começaram a ser bordadas muito mais tarde, conforme adiante se explicitará. Atualmente, borda-se sobretudo com fio de algodão perlé, podendo ser sublinhado com lantejoulas, vidrilhos ou missangas. Por vezes, também se borda com um fio prateado a que dão o nome de “cordão palheto”.
Nos trajos mais antigos pode-se ver bordado feito com outros materiais como fio de seda, fio de lã, fio de soutache, ou mesmo decorações feitas com galões. Todavia, enquanto o bordado ganha cada vez mais expressão, mormente no “forro” das saias e no “rigor” do colete, nota-se uma diminuição na qualidade dos riscos, que estão a ficar estereotipados, repetitivos, reduzidos a uma curta panóplia de motivos e combinações.
Num traje como o Traje à Vianesa – Viana do Castelo onde a versatilidade das combinações, muito evidente no caso do tecido das saias em que a tecedeira sempre se sentiu livre e sempre foi capaz para, a todo o momento, fazer as suas escolhas, torna-se motivo de reflexão, porventura de futura intervenção, acautelar o acervo de desenhos disponíveis, pois a bordadeira, ao contrário da tecedeira, necessita de um desenho que, a não existir, ela não consegue improvisar.
Sublinhe-se que o que está em causa não é a qualidade da execução do bordado, mas do desenho que lhe subjaz. Quase todas as peças do traje requerem trabalho de costura, muito evidente no caso das camisas, dos coletes e das algibeiras, mas que também é necessário na confeção das saias e dos aventais.
Os Aventais de Traje Minhoto
Reviewed by Marta Rainier
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maio 14, 2014
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